Publicado na revista Veja
As favelas crescem e se multiplicam no Rio de Janeiro porque são um bom
negócio para os que apostam na miséria.
Quando a favela começou e poderia ter sido retirada.
A favela da Rocinha hoje. 56mil moradores
As duas fotos que o leitor vê acima sintetizam um drama urbano. Elas mostram o crescimento da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, entre a década de 60 e os dias de hoje. A compreensão do fenômeno da favelização e de suas causas tem ocupado autoridades, políticos, acadêmicos e, claro, os cariocas que sofrem com a degradação de sua cidade. As explicações são muitas. Mas a história de Patrícia da Silva, 28 anos, pode ser um bom começo para entender por que as favelas não param de surgir e crescer. Patrícia mora com o marido e dois filhos na parte mais alta da Rocinha. O lugar tem o elegante nome de Laboriaux (pronuncia-se em francês, Laborriô), homenagem à família que era proprietária do terreno. Os barracos ali avançam morro acima formando um braço de pobreza em meio à Mata Atlântica. Sua casa, de 22 metros quadrados, está em situação irregular, ultrapassando os limites estabelecidos pela prefeitura para áreas de preservação ambiental. É uma das 89 construções nessa situação. Em quatro ocasiões, a prefeitura visitou Patrícia para informá-la de que teria de sair daquele local. A primeira foi há nove anos. Por algum tempo ela se sentiu impedida de continuar com melhorias em seu barraco. Mas acabou construindo uma laje. Voltou a ser advertida duas vezes até que, em junho de 2004, recebeu um ultimato da prefeitura: quinze dias para sair, ao fim dos quais seu barraco seria inevitavelmente derrubado. Até hoje, um ano e meio depois, os funcionários não voltaram para cumprir o ultimato. Não é só isso. Atualmente, as casas têm água fornecida pela companhia estadual de águas e esgotos, energia elétrica e serviço de telefonia fornecidos pelas concessionárias. Por 25 reais mensais, também podem ter TV a cabo, com 38 canais. Só quem não apareceu por lá foi o pessoal da prefeitura encarregado de conter o avanço das favelas.
A história de Patrícia não contém todos os ingredientes do fenômeno da favelização que ocorre no país, mas resume com clareza uma das principais causas – a inação do poder público. Sua casa está irregularmente instalada num terreno que não lhe pertence. E no entanto ela dispõe de todos os recursos para continuar no mesmo lugar, sejam eles oferecidos pelo Estado ou por empresas privadas. É pela soma de casos assim que, no Rio de Janeiro, o processo de favelização chegou a uma situação explosiva. São mais de 700 favelas no município, nas quais vive 1,1 milhão de pessoas. Boa parte delas está na Zona Sul da cidade, considerada um cartão-postal do país. Os danos são evidentes. Principalmente no que toca à segurança pública. Como esses locais se transformaram em trincheiras, com toda a dificuldade de acesso e monitoramento, a polícia não consegue desencastelar os bandidos. As explosões de violência são previsíveis e toleradas. Na semana passada, traficantes tomaram um ônibus e queimaram vivos os passageiros. Cinco pessoas que voltavam para casa morreram carbonizadas, entre elas uma menina de 2 anos. Doze pessoas ficaram feridas. Foi o 73º ataque de traficantes a ônibus no Rio de Janeiro neste ano. Nada foi feito antes para evitar esses ataques. Previsivelmente, nada será feito agora. Em um país civilizado, manifestações de crueldade e impunidade dessa magnitude derrubariam o prefeito, o governador, o ministro da Justiça e o presidente. No Brasil, vai-se colocar a culpa na desigualdade de renda e tudo continuará na mesma. Se o crescimento descontrolado das favelas é um drama, a impunidade dos criminosos que elas escondem é uma tragédia.
O primeiro passo para entender a favelização é notar que o processo é secular e nunca foi enfrentado a sério. A favelização ocorreu no vácuo do Estado. As favelas tornaram-se um bom negócio nas mãos de aproveitadores em geral e políticos em particular. Assim como no Nordeste, em que a "indústria da seca" é a garantia de que a miséria sempre vai existir no sertão, criou-se, no Brasil, uma indústria das favelas capitaneada por governantes populistas. O exemplo mais famoso foi o do ex-governador Leonel Brizola, que defendeu a manutenção dos barracos, concedeu títulos de propriedade e promoveu a criação de uma rede de ações de cunho assistencialista que impulsionou a favelização no Rio de Janeiro. Mas os casos se repetem. Centros sociais, mantidos por candidatos de olho na eleição seguinte, se multiplicam nessas áreas, oferecendo desde vagas para crianças em creches até serviço de ambulância. As disputas políticas acirradas chegaram às associações de moradores. Na última eleição para a associação dos moradores da Rocinha, a disputa se polarizou entre o ex-governador Anthony Garotinho e o prefeito Cesar Maia. O candidato do prefeito foi vitorioso. Vivendo em condições precaríssimas e com todo tipo de carência que se possa reunir em uma só região de uma cidade, a Rocinha é um dos maiores currais eleitorais do Rio de Janeiro. Nenhum político corre o risco de desagradar aos poderosos cabos eleitorais da favela. E quem são eles? Intermediários entre o mundo legal e os traficantes. Inocentes úteis cujas vidas são hipotecadas aos criminosos.
Rio da Pedras
O ônibus queimado dentro da favela
Mais recentemente, o oportunismo se consolidou de tal forma que esses currais eleitorais passaram a ser organizados segundo um princípio de domínio territorial semelhante ao imposto pelos traficantes na disputa pelos pontos-de-venda de drogas. As favelas passaram a ter donos, que, a pretexto de manter a ordem, exploram os serviços básicos, como a venda de botijões de gás ou o transporte alternativo, feito por vans e motocicletas. Veja-se o caso da favela do Rio das Pedras, na Zona Oeste da cidade, a 2 quilômetros do Autódromo Nelson Piquet. Trata-se da favela que mais cresce no Rio de Janeiro. Ali, o vereador Nadinho, do PFL, é o dono do pedaço. Dá as ordens e decide que ações a prefeitura poderá levar até a favela. Isso lhe garante os votos necessários para se eleger. Sua prática política vai tão longe que, antes mesmo de se tornar vereador, conseguiu estabelecer uma linha de ônibus que, duas vezes por mês, liga sua favela ao Nordeste. Criou uma ponte rodoviária que, entre outras coisas, facilita a migração. Nadinho tem o apoio político do prefeito Cesar Maia, de quem é um diligente cabo eleitoral.
Assim como têm um poder local, as favelas possuem um mercado imobiliário próprio. É falsa a impressão de que as favelas nascem e crescem infladas pela chegada de famílias sem um teto para morar. Normalmente, entre os primeiros a chegar estão os especuladores que constroem os barracos para vender ou alugar. Dependendo da localização na cidade, barracos de até 25 metros quadrados podem custar entre 10.000 e 20.000 reais. Isso é seis vezes mais do que o preço de um imóvel em Campo Grande, bairro de classe média baixa no subúrbio carioca. Esse mercado imobiliário favelado cresceu no vácuo criado pela falta de uma política habitacional minimamente eficaz. Nos últimos anos, 71% dos mecanismos de financiamento imobiliário foram destinados a pessoas com renda anual acima de 150.000 reais. Ou seja, a classe média e os ricos. Os pobres têm de economizar ou ir construindo aos poucos.
O problema do Brasil é que a favelização se expandiu de tal forma que o enfrentamento do problema depende de soluções mais complexas. Falar simplesmente em remover as favelas existentes é uma simplificação. Em boa parte delas isso não é mais possível, seja pelo emaranhado jurídico de uma ação desse tipo, seja porque o Estado simplesmente não tem dinheiro para fazê-lo. É mais fácil e barato urbanizar do que remover. Mas há situações em que a remoção pode e deve ser feita – quando as favelas estão em áreas de risco ou quando sua presença na paisagem tem impacto econômico negativo, como no caso do Rio. Seja qual for a solução adotada, é importante que o poder público se faça presente. A idéia das remoções se tornou maldita porque, nos anos 60, as experiências nesse sentido foram feitas com truculência e sucedidas por total abandono. Os conjuntos habitacionais para onde as famílias foram levadas se degradaram a tal ponto que se transformaram em novas favelas. A experiência mostra que, quando o Estado não ocupa o espaço, a desordem e, em seguida, o banditismo fazem esse trabalho. Primeiro aparecem as construções irregulares e, em pouco tempo, os traficantes de drogas.
Em seu livro Competição, o economista Michael Porter, professor da Harvard Business School, afirma que não existe solução fácil e descomplicada para o problema da degradação de áreas das metrópoles. A questão, porém, não pode deixar de ser atacada. Porter demonstra que a degradação se alimenta de miséria e esta gera mais apodrecimento urbano. Sua tese é a de que é preciso descobrir a vocação econômica dessas regiões para que elas possam progredir. Diz Porter: "Precisamos acabar com as tentativas de curar os problemas por meio do aumento incessante dos investimentos sociais". Que solução ele aponta? "Iniciativas e investimentos privados, visando ao lucro, com base no interesse econômico e na genuína vantagem competitiva." No caso brasileiro é preciso acrescentar a expressão "lícitos" depois de "iniciativas e investimentos privados".
domingo, 25 de abril de 2010
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Um mau que destrói a natureza no Rio de Janeiro!
Fui a Paquetá hoje, após muitos anos de ausência e fiquei muito triste ao perceber favela na escosta de morros. Porque será que as autoridades permitem que a Mata Atlântica seja destruída para a construção de barracos? A Mata é um patromônio de todos e deveria ser preservada.
Quando esta vergonha vai parar? O que fazer? simples...ao primeiro barraco construído, ir lá e retirar!!
São Jorge!!
Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer mal.
Armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrem sem o meu corpo tocar, cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar.
terça-feira, 20 de abril de 2010
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